Brasil disputa ilha submersa rica em metais para transição energética

Fonte: Gazeta do Povo

 

 Elevação do Rio Grande

 

A 1.200 quilômetros da costa sudeste do Brasil repousa no fundo do Oceano Atlântico a Elevação do Rio Grande (ERG), um conjunto de montanhas e cânions que já foi uma ilha tropical vizinha ao litoral brasileiro. Assentada sobre o assoalho marinho de 5 mil metros de profundidade, essa área de cerca de 500 mil quilômetros quadrados — quase do tamanho da Espanha — apresenta formações ricas em metais raros e outros cobiçados para aplicações tecnológicas e transição energética.

Na lista das crostas de ferro-manganês e nódulos polimetálicos estão metais como cobalto, níquel, lítio, telúrio, selênio, molibdênio e nióbio. O cobalto, o níquel e o lítio, por exemplo, são muito demandados pela indústria dos veículos elétricos. O cobre e o telúrio são especialmente importantes para a energia solar fotovoltaica. Com o aumento da demanda, a possibilidade da utilização desses metais provenientes da ERG passou a ser estudada por pesquisadores.

No entanto, a extração de metais da Elevação do Rio Grande está longe de se tornar uma realidade e o Brasil ainda aguarda o aval da ONU para que a região seja incorporado ao território nacional para exploração econômica. Por enquanto, o foco é na pesquisa científica da área descoberta pela Universidade de São Paulo (USP), que pesquisa a região com expedições de veículos operados remotamente, os ROVs, que tiram fotos, fazem vídeos e capturam materiais para análise em laboratório.

Hoje, por meio de um auxílio da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), um grupo de cerca de 50 professores e pesquisadores está estudando a fundo a ERG em oito áreas temáticas, que incluem geologia, extração, legislação, meio ambiente e extração. “O objetivo é conhecer o que tem lá, ver se há teores de minerais. Há indicativos de minerais, portadores de elementos muito requeridos na transição energética”, conta a vice-coordenadora do projeto da Elevação do Rio Grande no Instituto Oceanográfico (IO) da USP, Carina Ulsen. Hoje, o projeto é coordenado pelo professor Luigi Jovane.

 

Elevação do Rio Grande

Elevação do Rio Grande tem uma área do tamanho da Espanha. (Foto: Reprodução/LEPLAC-DHN/Marinha do Brasil)

 

Extração de metais na Elevação Rio Grande é alvo de estudo

O assunto da extração de metais ainda é muito incipiente, mas faz parte das pesquisas, principalmente do ponto de vista ambiental em virtude da exploração da ERG e as consequências para a vida marinha. Um dos focos do estudo está no método de extração, visto que existem diferenças significativas no processo usado com fontes terrestres.

Apesar da possível presença de metais bastante requisitados pela indústria, a área ainda não está no radar de grandes empresas mineradoras. Além de precisar de mais dados, a extração seria, possivelmente, muito complexa. Sem contar que o Brasil ainda tem muitas fontes terrestres de metais.

“Por isso, não sentimos pressão comercial. Na área de mineração o processo é longo. Em terra, entre a pesquisa e a mineração de fato, existe um intervalo de cerca de dez anos. No terreno submarino, mais tempo ainda”, ressalta Ulsen.

A USP conta com o apoio da Finep, mas ele é insuficiente para levar os pesquisadores novamente ao oceano e à Elevação do Rio Grande. A Marinha até tem um ROV disponível, mas faltam profissionais capacitados para operar o equipamento. “Se tivéssemos financiamento hoje, em dois anos teríamos uma revolução. Em um ano, daríamos muitos resultados químicos”, garante a vice-coordenadora do projeto.

“O processo de formação das crostas submarinas é diferente. Temos algumas amostras. Mas precisamos mapear com muitos detalhes para saber que tipo de elementos existem. Só que temos o desafio tecnológico de chegar até lá”, acrescenta o pesquisador de pós-doutorado sobre o tema na USP, Muhammad Bin Hassan.

Área da ERG ainda não pertence ao Brasil

Nas expedições anteriores, foram coletadas amostras de rocha basáltica com argila no meio. Além de mostrar a presença de metais raros, os pesquisadores conseguiram identificar que se trata de uma área com resquício de solo orgânico que teria se formado na superfície e não submerso. Isso significa que a Elevação do Rio Grande já foi uma ilha “vizinha” há milhões de anos, separada por um cânion profundo de 4,8 mil metros de profundidade, chamado de Canal de Vema.

Apesar da proximidade com o Brasil, a ERG está pelo menos 600 quilômetros além da chamada Zona Econômica Exclusiva (ZEE), área onde os países possuem soberania estabelecida sobre os recursos minerais e outras eventuais riquezas encontradas na água e no substrato marinho — as ZEEs foram criadas na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM).

Para ter o direito sobre a área, o Brasil pleiteia desde 2018 o reconhecimento da Elevação do Rio Grande junto à ONU. A justificativa do país é de que a ERG representa uma extensão da plataforma continental do Brasil — a Marinha chama toda essa área de Amazônia Azul. Por enquanto, a Comissão de Limites da Plataforma Continental (CLPC) da ONU não deu uma decisão sobre o assunto.

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