Ampliação do porto de São Sebastião: múltiplas faces do mesmo problema ambiental

mapa araca 1 678x381Publicado originalmente em AUN 13/06/2017

Em tempos de descaso ambiental, pesquisadores dedicam grande parte de suas vidas tentando descobrir quais são as melhores formas de se conservar um ecossistema. Baseando-se na premissa de que, na natureza, muitas instâncias estão relacionadas, Mariana Andrade, pesquisadora do Instituto Oceanográfico (IO) da USP, está utilizando um princípio chamado Ecosystem Based Management (EBM) para levantar hipóteses a respeito da percepção de impactos que uma construção pode causar na Baía do Araçá, em São Sebastião, São Paulo.

O EBM é uma maneira de entender um lugar a partir de processos que nele ocorrem. Para isso, exploram-se informações sobre a biodiversidade, a população, as instituições, as políticas e as normas da região. “Unindo tudo, conseguimos ter uma noção mais holística do ecossistema e de possíveis estratégias a serem usadas para o manejo desse ambiente. Assim, a gestão é pensada como um todo, não apenas tendo como base um setor específico”, pontua Mariana.

O Porto de São Sebastião, localizado no Litoral Norte paulista, está em atividade desde 1955. No entanto, nos últimos anos, aconteceram tentativas de ampliação da estrutura. Os projetos afetariam diretamente a região da Baía do Araçá — local destinado a pesca e lazer dos caiçara.

Em um primeiro momento, cogitou-se sobrepor o Araçá por meio de um aterro. Frente ao descontentamento da população, como alternativa, foi proposto a construção do Porto sobre estacas e lajes sobre a lâmina d’água da Baía do Araçá. Esta nova proposta não deixou moradores locais menos descontentes com a possibilidade de perder os acessos e usos daquela área. Pesquisas desenvolvidas pelo Instituto Oceanográfico (IO) da USP e outras universidades atestaram que o dano ambiental não seria reduzido de maneira considerável.

Assim, por meio de reclamações legais, moradores e pesquisadores conseguiram evitar que a ideia prosseguisse, atuando junto ao Ministério Público para suspender a licença de operação que o Porto de São Sebastião tinha para executar a expansão.

Por dentro do problema

A concepção do EBM pode ser feita por inúmeros mecanismos, basta abordar o problema de maneira integrada, buscando acesso a informações vindas de diversos setores, como o social, ambiental, jurídico, entre outros, simultaneamente. Segundo Mariana, a maneira mais lógica para se incorporar essa gama de conhecimentos, perante situações delicadas como essa, é desenvolver o trabalho de forma participativa.

Assim, reuniões com a comunidade local, realizadas como parte das pesquisas do Projeto Biota-Fapesp/Araçá nos últimos 4 anos, serviram para promover uma espécie de aprendizagem social, fazendo com que os próprios participantes da situação, individualmente, entendam-a e, de maneira coletiva, tomem decisões. Pensando no grupo, a população local conseguirá se organizar e desenvolver alguma estratégia de gestão, por meio da formação de ONGs ou grupos de ação, por exemplo.

O papel de Mariana é um pouco diferente. Para concluir seu estudo, a pesquisadora levanta hipóteses, por meio de entrevistas, sobre as diversas relações que pessoas, de distintos nichos relacionados ao problema, possuem com aquela região. Segundo ela, ainda que não existam conclusões, estima-se que pessoas mais ligadas ao Araçá, como aquelas que moram ou estudam na região, percebem os impactos e mudanças com mais facilidade e naturalidade, entendendo que essa estrutura a ser instalada altera processos complexos do ecossistema, como circulação e movimentação da biodiversidade.

“Sobre o Araçá, estamos tratando de um local de reprodução, com diversos processos ecossistêmicos”, completa. “Esse é meu objetivo no projeto: compreender as diferentes maneiras que as pessoas entendem os impactos de transformações ambientais como essa, tendo como pano de fundo uma noção de ecossistema conectado”.

Compartilhe